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Uma conversa sobre amor: sejamos amantes.

  • Foto do escritor: Monique Prado
    Monique Prado
  • 14 de jun. de 2022
  • 6 min de leitura

Atualizado: 14 de jun. de 2022


Dentre tantas conversas, a que mais me intriga é o amor. Não como um tutorial resumido de como alcançá-lo, mas um paradigma que recusa o status quo. Não como concessão, mas como realização. Não como algo posto, mas como algo que nos transforma cotidianamente.



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Sempre muito conectada à materialidade, recentemente tenho dado vazão à profundidade do meu ser, a fim de acessar o imaginário. Deixar a criatividade falar a despeito de toda a desgraça que atravessa o nosso povo, mas sempre atenta ao contexto, para não se entregar a completa negação.


Entre a neutralidade e a ação, é preciso se fazer a leitura das próprias emoções para não permitir que o pragmatismo nos tire o detalhe, a beleza, a sutileza, o respiro.


Mergulhar no desconhecido do ser com segurança é quase paradoxal, pois é vasto os devaneios. Portanto, é elementar estar aberto e conectado com os sinais corporais, bem como sensoriais, que nos atravessa, seja pelo cotidiano ou pelo trauma, a fim de buscar cura.


O amor tem sido elementar para adentrar essa estrada cheia de símbolos e códigos, afinal dá para chamar tudo de amor? O amor é mesmo essa universalidade de sentimentos? Como é que eu reconheço o amor para, de igual modo, poder execrar o desamor?



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Certo é que existe um imaginário coletivo sobre o amor e a sua nuance mais explorada está relacionada ao prazer e ao consumo, pois este "amor vendivel" opera na lógica da escassez, como se o amor precisasse ser imediatamente consumido, visto que está a um triz de ser exaurido, o que não é verdade. Por isso há toda uma indústria criada para proliferar a ideia de "final feliz". Entretanto, o amor sobre o qual me debruço, não é esse ou pelo menos, não exclusivamente esse, mas aquele amor partilhado levantado por bell hooks.


ama deusa das deusas justamente por ser além de um sentimento único, ou seja, está configurado como algo maior e difuso, trazendo inclusive a confusão de nomenclaturas como o erótico, o afetivo, a sexualidade, o desejo, o ódio e por aí vai.


Todavia, o amor é condição humana, é pulsão de vida, é elementar enquanto ação, ou seja, o amor é realização, movimento, ostentação dos próprios desejos. Ele é estratégia de sobrevivência para nos fazer levantar da cama todos os dias com o compromisso de se elaborar. Por isso, reverbera a noção de que amor é algo nuclear, pulsão que nos faz enfrentar as nossas angústias e lidar com as próprias sombras.


Nesse sentido, exercitar o amor é ir para além da excitação que ele produz internamente, é encontrar com os lados mais profundos de si, a fim de usá-lo como ferramenta de valoração libertária, para que os desejos reluza, ainda que eles sejam complexos de compreender de primeiro momento.


Nessa esteira, é importante observar o amor enquanto potência criativa e valorativa. De outra sorte, certamente não podemos chamar de amor o exercício de poder desproporcional quando dois sujeitos têm as mesmas condições de gerenciá-lo. Ou seja, é possível que uma mãe exerça autoridade sobre os filhos e isso permaneça dentro da esfera afetiva, mas uma mulher enquanto companheira que tem as mesmas condições de gerenciar as suas emoções, não pode ser subjugada na sua relação com a escusa de "proteção", pois isso é controle, é a forma mais pura do exercício patriarcal.


Com efeito, o amor é um recurso interno em dialética com o mundo externo que se expande para libertar o sujeito de armadilhas simbólicas, pois a posse, a manipulação e o controle criam um ideal de amor totalmente às avessas.



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O amor é também uma ferramenta transversal, uma vez que ele pode ser exercido na esfera individual, coletiva e universal. Dessa maneira, o amor é somático e permite expansão, ou seja, qualquer energia que vise suprimi-lo, miná-lo, ocultá-lo ou erradicá-lo, não é amor.


O elemento criativo do amor é fundamental para congregar pessoas que estão disposta a exercita-lo, visto que nos permite usar o imaginário a nosso favor para promover quebras com realidades disfuncionais que operem no plano prático e cotidiano, ou seja, uma vez que haja uma aderência por um sujeito ou uma coletividade de uma noção genuína de amor, sustentada pelos mesmos valores e sonhos, o amor floresce e desagua em realização.


Entretanto, a criatividade não pode ser confundida com falsas projeções, uma vez que o amor é ação, ou seja, ainda que o imaginário seja elementar, é preciso ter um grau de materialidade para fundamentá-lo no plano real, mesmo que esse novo real tenha como fim transformar o status quo.


Ora, a vida não está posta, existem uma série de códigos que desenham o modelo social que a gente tem. Ocorre que, o dia-a-dia às vezes nos faz esquecer que a vida é muito mais profunda do que está na ponta do iceberg. Somos atravessadas por identidades, vivências e estatísticas que muitas vezes configuram a nossa subjetividade como se aquilo fosse de fato a única coisa que temos a oferecer ao mundo.


Entretanto, há descobertas e resgates durante o processo que fomentam o amor enquanto energia criativa. O magnetismo daquilo que a gente não vê; aquela sensação que está na fresta; o som que faz o nosso coração bater diferente; o olhar para o novo; a adrenalina do risco ou a subida da montanha como vai dizer Sobonfu, são expressões dessa transgressão ao que está posto.




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Muitas vezes nos mantemos em fuga procurando em outras pessoas o afeto, a fim de terceirizá-lo na tentativa de recalcar o lado mais sombrio que também nos habita, mas que também precisa de amor. Contudo, isso nos causa uma série de intercorrências, pois ao invés de meditar nas nossas demandas e belezas emocionais, jogamos para a outra pessoa tal responsabilidade. É nesse momento que o "suposto amor" se torna um fardo, algo que nos empurra para a lamúria e o desassossego.


Com efeito, existem alguns pactos afetivos que somente serão possíveis se tivermos essa conversa antes de convidarmos alguém para aderir o projeto afetivo sobre o qual, no limite, será a extensão dos nossos desejos. É claro que para esse projeto afetivo ser eficaz a visão de mundo dos dois sujeitos precisa estar próxima, sob pena de castração, anulação ou manipulação dos próprios desejos e da outra pessoa.


Nesse sentido, o reconhecimento de si, é a máxima do amor, visto que para o nascimento de um acordo afetivo externo, é necessária a clareza sobre as próprias intenções e demandas emocionais.


A angústia aparece justamente quando há tentativa de encaixe nessa visão de mundo do outro sem ter meditado nas próprias intenções, a qual faz com que o sujeito se perca sobre os seus desejos ou, quando não, sufoca os desejos de quem se relaciona. Isso abre margem para um sofrimento sem precedentes, onde o sujeito começa a arder em um estado febril de desesperança.


Como somos atravessados por símbolos culturais e civis que amoldam o nosso comportamento dentro do tecido social, há também o perigo de uma camuflagem sobre o amor. É o momento em que ele é desfigurado e se perde na forma, não no conteúdo, ou seja, como amor é ação, não basta dizer que ama, é preciso trazer os desejos para conjugá-lo com o plano da materialidade, visto que o amor bebe da fonte do cuidado, da curiosidade e do afeto.



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Há também que se pontuar que amor não é moeda de troca, ou seja, buscar incansavelmente suprir os próprios desejos a partir da emergência, ao invés de dar espaço para permitir experimentar as querências e fruir primeiramente nas próprias realizações.


O amor não se sustenta com ilusões ou mentiras, pois juntas levam a inanição. Por mais que em princípio pareçam curar, na verdade são placebos para ocultar os desejos, ou seja, operar no campo da mentira, muitas vezes serve como escudo para sustentar uma persona.


Não se pode ter intimidade plena com alguém que sequer olha para si, alguém que se desconhece, se nega ou se oculta para parecer ou fazer de conta que não vê aquilo que o reflexo está mostrando. O Narciso se apaixona pela representação de si e não pelos seus desejos, uma vez que estes permaneceram ocultos.


Por isso, é fundamental que se busque auto percepção, pois o amor como está, não é para todos e alguém vai querer dizer para você que você está amando errado, dada a quantidade de símbolos. O desconforto na auto descoberta pode ser, de fato, muito doloroso, mas traz para o campo sensorial aquilo que o racional não daria conta.


O amor tem algo de misterioso justamente porque é genuíno, elementar, intuitivo, espiritual e magnifico. O amor é antes de tudo, acolhimento, força motriz, derrubada de paradigmas, fruição e potência. Sejamos amantes.



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©2025 por Monique Rodrigues do Prado

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