O voz textual que corre pela minha garganta
- Monique Prado

- 8 de out.
- 3 min de leitura
Durante esses meses que eu terminei o mestrado uma sensação de desimportância me tomou o peito, talvez por estar solta e sem coletivo desorganizada politicamente no sentido de ter um corpo social que abrace as minhas agonias. Confesso que até tentei organizar um pouco dessas várias habilidades por meio de Inteligência Artificial mas fui levada a refletir por morena Mariah em seu novo podcast "Senta aqui"sobre a terapia ocupacional que a fez moldurar o que é hobby e o que de fato é potencialmente atividades que possam ser relevantes para o campo profissional.

Nesse sentido resolvi criar a minha própria estratégia ou a chamada metodologia de como ativamente fiz algumas coisas funcionarem na minha vida, no sentido de encontrar o tal do propósito, qual seja, possibilitar que pessoas assim como eu possam sair do ciclo vicioso do medo e da escassez e frutificar através do contato com as próprias raízes.
Sempre tive um compromisso honesto com uma transformação interna, embora tão logo tenha percebido que não há transformação real e concreta que pare exclusivamente na minha vida. O ato de escrever sempre foi uma fuga que encontrei para recriar memórias e produzir imaginários.
Na minha infância escrevia compulsivamente em cadernos dos quais dedicava exclusivamente para me divertir e chorar. Um exercício de arrancar de dentro de mim o que estava sentido sem nenhuma intensão terapeutica. Lembro que aqueles primeiros textos me davam espaço no mundo e recorrentemente narrava o sentimento de medo. Muitos anos depois, joguei todos esses cadernos fora justamente para não precisar encarar algo tão íntimo e profundo que guardava neles. Coisas como o primeiro amor, brigas, sonhos, memórias... Desejos de uma quase adolescente. Mais tarde na terapia algumas memórias emergiram uutras ficaram naquele caderno.
Fui encontrando na escrita muitos caminhos de passagem: ora ficcional, ora emocional ora inventivo e criativo. Não me lembro nesse primeiro momento em ter um compromisso com a realidade no que estava produzindo e isso me permitiu transitar entre uma escrita livre e poética em que o cotidiano ora transformava esses textos em um diário cheio de crônicas, ora em fantasia.
Jamais iria pensar que esse plano de fuga se tornaria mais tarde algo que me permitiria escrever de forma institucional como mais tarde de ver acontecer com a escrita jurídica e acadêmica; muito menos que essa escrita poderia tomar uma forma pedagógica e metodológica de potencialidade emancipatória que tivesse conexão com a minha existência enquanto mulher negra. Essa escrita cambaleada permeada pela oralidade me permitiu acessar caminhos muito densos dentro da minha própria personalidade mas se expandiu para o campo das instituições tão logo quando entrei na universidade e depois durante todo o meu percurso jurídico enquanto advogada.
Recentemente a minha experiência com a escrita se deu com o nascimento da minha dissertação de mestrado e antes disso a escrita também me permitiu transitar por alguns espaços muito interessantes com a produção de oficinas teórico-práticas que ao invés de sabotar a minha existência fomenta o que há de mais potente e vivo dentro de mim que não me prendo efetivamente a memória concreta mas vou desenhando caminhos imaginários e poéticos.
Há com certeza uma subversão com essa forma textual em que a liberdade recria a moldura da textualidade e por si só vai afunilando métodos que desobedecem o cânone. Isso vai aparecer em Leda Bispo, Leda Maria Martins, Conceição Evaristo em Ana Maria Gonçalves e Granda Kilomba.
Existem becos internos que produzem uma textualidade única não porque para na obscuridade desse medo Inicial que alavancava aquela textualidade de uma quase adolescente tentando decifrar e colocar em códigos lineares o que sentia. Hoje e como naquela menina também acontecia as crônicas que dialogam com o Imaginário ora flertam com a realidade ora com a criação como uma tentativa de organizar uma gramática emocional para si que dialogue com o tempo desobediente.
Me parece que o medo é parte de uma estratégia flagrante de minar o movimento criativo. A subversão em continuar escrevendo entra em convergência com a performance do corpo, portanto, com a oralidade, de modo que, assumir as fantasias do meu corpo é magnetizar as texturas das quais esse complexo está sujeito: experiências gestuais e conversas não verbais que em conjunto produzem uma teoria emergente. É como um rio que precisa correr para desaguar em cascata com bastante força e brutalidade. Esse rio precisa passar para virar uma outra coisa e se transformar em algo ainda maior em queda livre. É assim que vejo a potência daqueles textos infantis que me permitiram criar todos os frutos dos quais colho hoje.
Falar da escrita de uma forma gentil me faz lembrar o que é constituinte da minha subjetividade enquanto mulher preta. Eu não sou nada sem escrever!!! Nada sem falar!!! Nada sem sentir a vibração das minhas cordas vocais transitarem pela minha garganta.






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