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O impacto da COVID-19 nas mulheres: um recorte de gênero, raça e classe.

  • Foto do escritor: Monique Prado
    Monique Prado
  • 19 de out. de 2021
  • 4 min de leitura


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As mulheres negras são 27,8% de toda a população brasileira na esteira da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua do IBGE. Entretanto, no contexto sócio-econômico, elas são a população mais vulnerável, o que mostrou-se ainda mais grave no cenário da pandemia da COVID-19.

Em um recorte somente de gênero, a economia do cuidado, ou seja, “o trabalho invisível" desempenhado pelas mulheres revela que elas chegam a trabalhar 12,5 bilhões de horas para as atividades do cuidado, segundo dados da Oxfam. A pesquisa demonstra que esse trabalho não remunerado equivale a 10 trilhões de dólares que deixam de ser pagos por ano, o que equipara-se a 24 vezes a economia do vale do silício.

O mesmo estudo demonstra que no caso das mulheres brasileiras, elas passam até 61 por semana em atividades não remuneradas.

O trabalho do cuidado, ou seja, atividades reprodutivas, de saúde e doméstica é que dá subsídio para que outros setores funcionem, pois a política, a indústria, o comércio, o agronegócio, os serviços, o transporte e a tecnologia só operam em razão da pirâmide sólida de mulheres que seguram em sua base os cuidados relacionados a faxina, a alimentação, ao aleitamento, às roupas, à prevenção de doença, a higiene, à educação dos filhos, enfim, de toda a engenharia de um lar.

As mães solos, ou monoparentais, ou seja, o arranjo familiar de mulheres que são as únicas responsáveis por prover o cuidado dos filhos sozinhas, chegam a no território brasileiro, o que denuncia um panorama de negligência sócio-econômica e afetiva por parte desses homens-pais. Salienta-se que dessas milhões de mulheres, 61% são mulheres negras, de acordo com o IBGE.

As mulheres negras são a maior parcela das mães solos, as quais ficam responsáveis por gerenciar os lares, os filhos e trabalharem fora, com jornadas exaustivas de trabalho. São elas também que se defrontam com o problema estrutural da desvalorização, pois realizam atividades relacionadas ao cuidado, como as diaristas, as empregadas domésticas, cuidadoras, babás, profissionais da saúde e trabalhadoras terceirizadas que enfrentam na ponta a precarização do trabalho intensificada com a reforma trabalhista.

Os marcadores que atravessam as mulheres negras demonstram que são elas enfrentam restrições no acesso à internet, moradia, educação e saneamento básico, pois 42% das mulheres negras não contam com saneamento básico e 28% não têm internet, em comparação a 28% e 23% das mulheres brancas.

Na COVID-19 o aprofundamento da crise sanitário-econômica jogou luz à desigualdade racial. É o que revela a Rede de Pesquisa Solidária no último dia 20 de setembro que cruzou dados mostrando que mulheres negras morrem mais de covid-19 do que todos os outros grupos Raciais, independentemente da ocupação, aponta a pesquisa.

Na outra ponta, as profissionais mulheres negras da saúde que estão na linha de frente, também são mais impactadas. Segundo pesquisa da FGV, elas são em geral técnicas de enfermagem ou agentes comunitárias de saúde e estão mais expostas ao risco do contágio, recebem menos treinamento, orientação e equipamento de proteção.

Além do mais, a ausência de trabalho formal, de internet ou infraestrutura em suas residências, sobrecarregam essas mulheres negras que se viram sem rede de apoio e com um auxílio emergencial federal de R$ 1.200, valor ínfimo perto das necessidades básicas de saúde, moradia, alimentação, já que não há mais merendas. Além disso, a ausência de internet ou estabilidade da conexão impactou no home office de mulheres periféricas e nas atividades escolares de seus filhos, pois não conseguem assistir aulas, baixar materiais e tarefas escolares pelo celular, sem qualquer condição de isolamento social adequado.

Nesse período, denota-se que 45% das empregadas domésticas, sejam elas, diaristas e mensalistas, foram dispensadas em consonância com o Instituto Locomotiva. De igual maneira, a pesquisa divulgada pela Gênero e Número, mostra que 41% das mulheres que mantiveram seus trabalhos durante a pandemia afirmaram que passaram a trabalhar ainda mais agora.

Para além do cenário sócio-econômico, a ausência de políticas públicas pensadas para mulheres negras que estão na cruzada entre gênero, raça e classe por serem atingidas pela falta de acesso, informalidade e abandono afetivo, são parcas.

No tocante às violências baseadas em gênero as pesquisas mostram que são subnotificadas. Entretanto, observa-se que 75% das mulheres assassinadas no primeiro semestre de 2020 no Brasil eram negras de acordo um levantamento feito pelo G1 com base nos dados oficiais dos 26 estados e do Distrito Federal.

Nesse sentido, embora sejam a maioria da população brasileira, as mulheres negras são apenas 2% do Congresso Nacional e menos de 1% na Câmara dos Deputados segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua. No mesmo sentido, Mulheres negras são menos de 5% das(os) prefeitas(os) e vereadoras(es) eleitas e eleitos nas Eleições de 2020.

Com efeito, essas são experiências sociais desencadeadas pelo racismo estrutural e pela violência de gênero.

Observar a interseccionalidade entre gênero, raça e classe dentro dos aparelhos públicos e das instituições que possuem poderes decisórios, seria fundamental para construção específica de políticas dentro do cenário na covid-19. Todavia, o Estado Brasileiro foi negligente com essas mulheres, de maneira que agora o que nos cabe é impulsionar essas discussões para acabar com a violência estrutural contra mulheres negras e mãe solos.



Referências

G1. Mulheres negras são as principais vítimas de homicídios; já as brancas compõem quase metade dos casos de lesão corporal e estupro. Disponível em: https://www.google.com/amp/s/g1.globo.com/google/amp/monitor-da-violencia/noticia/2020/09/16/mulheres-negras-sao-as-principais-vitimas-de-homicidios-ja-as-brancas-compoem-quase-metade-dos-casos-de-lesao-corporal-e-estupro.ghtml. Acesso em: 15 de out 2021.

GÊNERO E NÚMERO. 2020: o ano da pandemia e seu impacto nas mulheres, pessoas negras e LGBT+. Disponível em: https://www.generonumero.media/retrospectiva-2020/. Acesso em: 15 de out 2021.


________ . Um retrato das mães solo na pandemia. Disponível em: https://www.generonumero.media/retrato-das-maes-solo-na-pandemia/. Acesso em: 15 de out 2021.


JORNAL DA USP. No Brasil, mulheres negras têm maior mortalidade por covid que qualquer grupo na base do mercado de trabalho. Disponível em: https://jornal.usp.br/ciencias/mulheres-negras-tem-maior-mortalidade-por-covid-19-do-que-restante-da-populacao/. Acesso em: 15 de out 2021.


OXFAM BRASIL. Disponível em: https://www.oxfam.org.br/blog/mulheres-negras-e-pandemia/. Acesso em: 15 de out 2021.


THINK OLGA . Economia do Cuidado

como podemos visibilizar o trabalho invisível das mulheres na economia do cuidado?. Disponível em: https://lab.thinkolga.com/economia-do-cuidado/. Acesso em: 15 de out 2021.





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